Introdução à antropologia: um breve resumo sobre os clássicos, apoiado em Everardo Rocha.
A obra “O que é etnocentrismo?”, serviu muito bem como introdução ao pensamento antropológico, o capítulo “Pensando em partir” apresenta o conceito de etnocentrismo como um ponto de partida elementar. Everardo Rocha define etnocentrismo como “uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência” (ROCHA 1988, p. 5). Dentro da lógica etnocentrista, encontram-se inúmeros recortes históricos de momentos onde houve uma tentativa de justificar com o discurso de superioridade, os processos de dominação e extermínio de povos, tal qual o do Europeu sob os nativos de suas colônias, como a escravidão nas Américas, ou Nazismo alemão.
Apesar de ter sofrido
intervenções ao longo da história, a ação de interpretar o outro tomando a
perspectiva moral e/ou cultural do observador como a ideal, está presente na
modernidade, sendo representada pelos discursos contra minorias, e manifestada
na “fobia” em desfavor destes grupos. O autor ilustra a visão do etnocentrista,
que vê aquele que é diferente de si como um selvagem, um bárbaro, qualquer
coisa, menos um humano (ROCHA, 1988, p. 6), o etnocentrismo busca desumanizar o
outro.
Para a superação deste
estado, Everardo apresenta ao leitor o conceito de Relativismo Cultural, onde o
intuito principal é identificar o “outro” segundo sua realidade, sua cultura,
sendo esta última passiva de ser analisada somente à luz de seus próprios
códigos, o que está relacionado com o estabelecimento de críticas a esquematização
do pensamento Evolucionista Cultural, que acreditava que os homens tivessem uma
natureza comum, porém estivessem em estágios diferentes da evolução de suas
organizações sociais. Novamente, teorias como essa encontram momentos
correspondentes na história com efeitos violentos, intervenções de povos que se
julgavam “mais civilizados” a sociedades classificadas como “menos evoluídas”
se deram durante todo período colonial, com um discurso de “levar àqueles povos
não civilizados, fé, cultura e evolução”.
Paralelo a isso, acho válido
ressaltar dentro da história do pensamento antropológico – dado sua grande
influência na Sociologia –, o alinhamento ao pensamento positivista do filósofo
Auguste Comte, que esquematizou a Lei dos três estados, o teológico, metafísico
e o positivo. Sendo o último, o estado em que os homens de seu tempo, cultura e
sociedade estavam, o mais evoluído.
Uma contribuição do
pensamento Evolucionista foi a conceitualização atribuída a Edward Burnett
Tylor sobre a cultura, que para ele é “[...] aquele todo complexo que inclui
conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume e quaisquer outras capacidades
e hábitos adquiridos pelo homem na condição de membro da sociedade” ([1871]2005,
p.31). Para Tylor, a cultura era evolutiva, partia de um ponto comum a todos os
homens (a selvageria), sendo assim, universal, e que os diversos povos se
encontravam em estágios diferentes desta evolução – dentro das leis universais
da evolução cultural. O pensamento de Tylor sobre cultura, diverge da perspectiva
de Franz Boas que apresentou o Relativismo Cultural, citado por Everardo Rocha.
Para Boas, a cultura era algo plural. Em análise, Celso Castro escreveu: “A
concepção boasiana de cultura tem como fundamento um relativismo de fundo
metodológico, baseado no reconhecimento de que cada ser humano vê o mundo sob a
perspectiva da cultura em que cresceu [...]” (CASTRO, 2004 p.18).
Boas, que também era formado
em geografia, pesquisou a respeito do determinismo geográfico e sua influência
sobre a cultura, pois acreditava que as particularidades (que não eram
consideradas na teoria evolucionista), era o mais importante para uma
aproximação da compreensão da cultura de um povo. Além de ter sido o primeiro a
romper com a Teoria Evolucionista e propor o Método Histórico, que analisa
particularmente as culturas, e rompe com a ideia de que a mente humana obedece
a leis universais, Franz Boas junto a Bronislaw Malinowski passaram a ser
considerados os pais da etnografia. Boas buscava no trabalho de campo observar
a cultura, buscando sua compreensão a partir da análise da relação do nativo
com meio físico e as condições sociais em que vivia.
Mas foi Malinowski que
esquematizou o trabalho etnográfico. Malinowski deu orientações a respeito do
objetivo genuinamente cientifico do pesquisador, as condições de trabalho que deveriam
envolver uma relação direta com o nativo, sem intermediação de um branco,
quanto ao método de coleta e manipulação e registro das evidências (a exemplo, sua
perspicácia em provocar uma situação imaginária afim de obter respostas do
nativo sobre uma possível tomada de ação diante de um ocorrido, muito eficaz
comparado a pergunta direta, que incorre em possibilidades de má compreensão
por motivos linguísticos).
Malinowski em sua obra
“Argonautas do pacífico central” apresenta sua compreensão sobre o Kula,
o sistema econômico sob o qual as relações sociais se norteavam na tribo que
ele observou. O funcionalismo, sobre o qual se orientou a pesquisa etnográfica
de Malinowski, busca por compreender como se dá o esquema básico da vida tribal
(seus interesses, anseios), delineando os padrões e isolando fatos
irrelevantes. O grande interesse de Malinowski era descobrir como se produziu o
costume ou a crença, não lhe interessava o costume em si, isoladamente, mas sim
a compreensão do fenômeno que lhe deu origem.
O
termo “história” gera bastante discussão, sabemos a partir da definição
clássica de Marc Bloch, da Escola dos Annales, que a História – disciplina
acadêmica, é a “ciência dos homens no tempo”. O termo “história” pode também
ser entendido como “memória” (frequentemente confundido com “lembrança”), na
perspectiva da história, a memória é coletiva, é uma reconstrução do passado
que serve aos interesses do presente, comumente manipulada, intencionalmente ou
não.
A função do historiador, dada
existência desta manipulação é tentar separar o real do mitológico, ele o faz a
partir da análise das fontes que são objetos que sofreram interação humana.
Minha concepção sobre a importância do conhecimento Antropológico dentro da
História tem aqui seu ponto de partida. A História, para interpretar essas
fontes, necessita da interdisciplinaridade, pois o total aproveitamento das
potencialidades de uma fonte se dá a partir da análise de um especialista.
Já que o homem é o objetivo
do estudo da ciência histórica, e seus rastros do passado que se manifestam nas
fontes são analisadas para entender o presente, é importante remontar contexto em
que estas fontes foram produzidas, e não se pode entender o contexto de
produção sem antes tentar remontar a cultura daquele tempo. Portanto, o
contexto cultural no qual aquela fonte foi produzida, será analisado pelo
historiador, que não sendo neutro, analisará aquela cultura, a partir do ponto
de vista de seu tempo.
O historiador corre alguns
riscos ao analisar o passado, sendo o maior deles a anacronia, tal como no
passado os primeiros antropólogos atribuíam juízo de valor sobre os “menos
civilizados”, o historiador corre o risco de erroneamente analisar o passado
com o olhar moral e ético da contemporaneidade. Mas assim como o antropólogo
que adentra a tribo para analisar a relação do individuo com sua cultura, ou a
relação de produção de significado dentro de uma estrutura cultural, e obtém
algo próximo a inteligibilidade ainda que imperfeito ou “de segunda mão” sobre
a cultura; o historiador assim faz com o passado com o objetivo de responder
perguntas do presente.
A Antropologia estuda o
homem como ser biológico, social e cultural, a História estuda o comportamento
deste homem através do tempo.
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